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Fui educada durante o período de ditadura militar. Como nasci junto com o golpe, aprendi na escola somente o que o Governo Militar desejava que eu aprendesse.

Meus heróis nacionais eram somente os que eu aprendia na aula de História Brasileira. Naquela época era assim.

Na pré-escola, todo dia tinha que declamar meu amor à bandeira: “amo tanto a minha Pátria, entre todas é a primeira, aqui ficará conosco, seu retrato a bandeira”. Nesta fase ainda estudava em escola estadual, que um dia, acreditem, foi boa! Os mais velhos podem comprovar. Tinha que desfilar todo 7 de setembro. Hoje graças a Deus posso descansar nesse feriado... Uma vez desfilei de portuguesa com uma fantasia autêntica emprestada pela filha de uma amiga da minha mãe... Ela conseguia de tudo: fui o destaque do desfile, com elogios da diretora e entre outros... Afe... Passado a gente tem que recordar com calma.

Era muito comum cantarmos o Hino Nacional antes de entrar na aula. Eu, meus irmãos e meus colegas sabíamos o Hino inteirinho e nem poderia ser diferente. Lembro nas comemorações da Copa de 70 que também cantamos o Hino. Aliás, acho que só me recordo desta fase porque no meio da festa vi um vizinho soltar um rojão que pegou o rumo errado e ele ficou cego. Um horror. Ta vendo... cada lembrança.

Mais tarde, quando já estudava em colégio particular (de freiras) tinha as inesquecíveis aulas de música com a Irmã Arlete. Uma freira muito idosa que obviamente tinha grande dificuldade em disciplinar um monte de criança. Até porque dentre todas as disciplinas as aulas de música, artes e educação física faziam parte do paraíso. Mas a Irmã Arlete nos aplicava um castigo muito curioso e reflexivo: quem fizesse bagunça na aula, tinha que cantar o Hino Nacional inteiro de pé, sozinho e na frente de todos. E cantávamos. Era um saco porque ficávamos cantando sozinhos para o resto da sala, mas não havia dificuldade, pois conhecíamos bem o Hino.

Hoje quase ninguém sabe o Hino inteiro, curioso... Será que é trauma? Sim porque não imagino que alguém tenha saudade do Regime Militar. Vale ressaltar que ainda na adolescência, ao ler “Brasil Nunca Mais”, descobri que estava sendo enganada. Será que deveríamos ser ressarcidos por pagarmos para aprendermos coisas erradas. Na época ainda não havia o Código de Defesa do Consumidor que é de 1991. Mas se pensar bem, caberia uma indenização.

Hoje, nas raras situações em que o Hino toca, é divertido e vergonhoso observar os momentos de falhas das pessoas ao cantarolar. Nos eventos esportivos, mais recentemente nos Jogos Panamericanos, por ser muito longo e interferir no tempo de transmissão o Hino é encurtado. Em alguns casos toca-se apenas a primeira parte. Em outros toca um trecho da primeira e um trecho da última. Ora, desta forma é que ninguém mais vai aprender mesmo. Sempre teremos que assistir ao “mico” de nossos atletas que nos representam...

Se nem os nossos símbolos, seus conceitos e significados conhecemos, como é que podemos defendê-los, honrá-los e divulgá-los?

O curioso disso tudo é que nos emocionamos, e muito a ouvir o Hino acompanhando o asteamento de nossa bandeira. Pois normalmente isto significa um primeiro lugar em alguma competição. Pelo menos para quem não participa de cerimônias políticas, mas aí a história é outra. Nem sei se tenho bagagem para fazer uma analogia de nossos símbolos nesse ambiente. Os atletas estão reprovados neste quesito, mas e os políticos? Será que sabem cantar o Hino inteirinho? E será também que sabem interpretar o conteúdo? Gostaria muito que algumas câmeras indiscretas nos revelassem essa verdade.

A Irmã Arlete faz falta. Aplicaria um belo corretivo em todos!

Denise Monteiro

Jan/2011